domingo, 19 de janeiro de 2014

Edição 147 - A copa do Mundo ou o Mundo da Copa

Muitas são as semelhanças entre os fatos por onde a "Copa do Mundo" é realizada.
Se fala tanto em legado, mas o questionamento a ser feito é:
Legado a que preço e para quem?


Copa de 50 teve várias semelhanças com o Mundial deste ano: intenção de mostrar ao mundo a “grandeza” do Brasil, dinheiro público na organização, briga de autoridades pela paternidade de estádio, atraso de obras e uma eleição presidencial logo depois.

2014 começa com duas semelhanças em relação a 1950. Ambos são anos de Copa do Mundo. E de eleições para presidente, governador, senador e deputado. Do lobby do ex-presidente Lula para garantir o evento no Brasil, em 2007, passando pela disputa regional para definir as 12 subsedes e pelas manifestações de 2013, o cenário político atual está fresco na memória. Mas como foram e quanto custaram os preparativos para 1950?
Operários limpando o Rio Belém, na frente do Ferroviário – junho de 1950
Há dois anos, quatro jornalistas levantaram histórias do planejamento feito para a o Mundial de 50. O trabalho resultou no livro 1950: O preço de uma Copa (Editora Letras do Brasil). “Existe todo tipo de obra sobre o que aconteceu dentro de campo na derrota para o Uruguai, o que queríamos era desvendar o que houve fora dele”, diz Murilo Ximenes, um dos autores.
O Colosso da Vila Capanema, em 1950
Não foi uma tarefa simples – a começar pela dificuldade de separar gastos públicos e privados e pela falta de comprometimento com a prestação de contas na época. Em uma soma das despesas possíveis de serem levantadas, com valores corrigidos, a Copa teria custado R$ 437 milhões. O valor é 64 vezes menor que os R$ 28 bilhões estimados para 2014.
Em 1950, a ampliação das arquibancadas com madeira
Fatores externos
Essa, porém, é apenas uma parte da história. O primeiro Mundial no Brasil só ocorreu graças a uma conjunção de fatores políticos internacionais. Passada a II Guerra, o mundo era um lugar confuso em 1946. Não fosse o conflito bélico, seria o ano da quarta Copa da história (a de 1942, pleiteada pela Alemanha nazista, já havia sido cancelada).
Com a Europa em cacos, a solução foi dar um tempo e planejar um novo campeonato, previamente estipulado para 1949. Onde? Na América do Sul. A primeira opção seria a Argentina, mas não houve acordo entre as autoridades do país e a Fifa. Coube ao Brasil sediar a competição.
Vista aérea do Estádio Durival Britto na Copa de 50
Era a deixa para colocar o “gigante” no mapa-múndi. O primeiro passo seria a construção de um novo estádio, na então capital do país, o Rio de Janeiro. Mas não poderia ser qualquer estádio, precisava ser o maior do mundo.
“No começo da Guerra Fria, havia um consenso de que para causar impacto, para conquistar respeito internacional, era necessário fazer obras que impactassem pelos números”, diz André Mendes Capraro, do Núcleo de Estudos Futebol e Sociedade da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Nesse contexto, ter a paternidade político-­eleitoral do empreendimento era fundamental.
Nascia o principal imbróglio da Copa. Eleito presidente para o período 1946-1950, Eurico Gaspar Dutra ficou de fora das articulações para trazer o evento para o Brasil. Mas esteve no eixo da “Batalha do Estádio Municipal”.
Jogo da Copa com andaimes da construção da cobertura do Maracanã: competição começou com o estádio inacabado
Dutra foi o responsável pela nomeação do prefeito do Rio, Ângelo Mendes de Ribeiro, em 1947. Ribeiro defendia que o estádio fosse construído às margens do Rio Maracanã, na Zona Norte. Então deputado federal e rival de Dutra, Carlos Lacerda fez uma ferrenha campanha contra os gastos com a obra e defendia que a construção fosse em Jacarepaguá, a 40 quilômetros do Centro da cidade, na Zona Oeste. O aliado do presidente venceu e o Maracanã saiu do papel a um custo atualizado de R$ 416 milhões, que corresponderam a 95% do total dos gastos com a Copa.
“Pelo que vemos na construção dos estádios de hoje, até que a obra do Maracanã andou rapidamente”, afirma Lycio Veloso Ribas, autor do livro O Mundo das Copas (Editora Lua de Papel). Do começo da construção ao primeiro jogo do Mundial, entre Brasil e México, foram-se 22 meses. Nessa partida, contudo, andaimes seguravam a cobertura da arquibancada.
Dias depois, no confronto entre Brasil e Iugoslávia, o iugoslavo Mitic bateu com a cabeça em um ferro exposto da construção no vestiário e, ferido, só conseguiu entrar em campo depois de a partida ter começado.
O governador Moisés Lupion recebe o embaixador da Espanha, que veio assistir ao jogo da seleção do seu país contra o time dos Estados Unidos. Foto de 23 de junho de 1950
Outras obras
Dos demais cinco estádios, apenas o Independência, em Belo Horizonte, foi construído para a Copa, a um custo estimado de R$ 10 milhões atual­mente. Todos os demais já existiam e receberam pequenos ajustes – algo bem distante do atual padrão Fifa. Na Ilha do Retiro, no Recife, as adaptações foram feitas em um mutirão de torcedores do Sport.
O estádio pernambucano foi escolhido a dois meses do início dos jogos e foi palco de uma única partida: Chile 5 x 2 Estados Unidos. O motivo: não havia nenhuma subsede nordestina. Como comparação, do total de 22 jogos do Mundial, oito foram no Maracanã e seis no Pacaembu, em São Paulo.
A propósito: mesmo com o “bônus” do maior estádio do mundo, o candidato do partido de Dutra na eleição presidencial, Cristiano Machado (PSD) ficou em terceiro lugar, com 21,49% dos votos. O nome da UDN de Lacerda, Eduardo Gomes, ficou em segundo, com 29,66%. Quem ganhou foi Getúlio Vargas (PTB), com 48,73%, que pouco, quase nada, se meteu nos assuntos da Copa.

Créditos
http://www.gazetadopovo.com.br/vidapublica/conteudo.phtml?tl=1&id=1440785&tit=Politica-de-chuteiras

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